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ARTIGOS DE OPINIÃO

Exclusão Industrial e Propriedade Intelectual


Os países em desenvolvimento estão sendo duramente afetados pelo fenômeno identificado como "nova exclusão industrial", iniciado na última década do século 20. Além da simples recusa de vender tecnologia que representa um diferencial da empresa, esse quadro vem sendo agravado pela imposição de mecanismos de restrição de mercado, em que algumas tecnologias somente são vendidas se o comprador comprometer-se a vender o produto em uma região específica.

É inegável que, ao limitar as exportações, os detentores dessas novas tecnologias comprometem as estratégias de produção das empresas dos países em desenvolvimento. Para uma parcela de empresas brasileiras, que tradicionalmente compram tecnologias no exterior, essa "exclusão industrial" dificulta a ocupação de novos mercados. Dessa forma, países, instituições e empresas que dominam o conhecimento passam a deter considerável poder econômico e político.

Diante desse cenário, no qual o acesso à tecnologia avançada, por meio de importação, é uma alternativa que está se tornando inviável diante da tendência de privatização do conhecimento no mundo, fica evidente que os países emergentes, como é o caso do Brasil, terão que reformar e melhorar os seus modelos de desenvolvimento científico e tecnológico. Explica-se a carência de um modelo consistente de desenvolvimento tecnológico autônomo no Brasil, entre outras razões, pela pequena participação, em termos de investimentos, das empresas nacionais em ciência e tecnologia.

Um dos entraves históricos à formação de uma tecnologia inovadora nacional é a circunstância de que a nossa industrialização se deu com forte participação de empresas transnacionais, cujos centros inovadores se situam nas suas matrizes. As suas produções locais eram protegidas por elevadas barreiras alfandegárias. Nesse ambiente, as empresas brasileiras não tinham nenhum estímulo para gerar inovações próprias, limitando-se a adquirir licenciamentos de tecnologias importadas. Essa foi a principal diferença do nosso processo em relação ao da Coréia do Sul e ao de Taiwan. A industrialização nesses países ocorreu exclusivamente com empresas nacionais, ainda que no início com tecnologias licenciadas.

Verifica-se, assim, que o país necessita definir uma política industrial que tenha como objetivo o aumento da eficiência geral do setor, que é obtido pela modificação do parque produtivo e a introdução de novas tecnologias. É essencial, ainda, que essa política industrial esteja enquadrada nas diretrizes gerais de política econômica do país - que requer uma política industrial orientada para a exportação. Nas suas diretrizes deve priorizar o avanço do conhecimento e promover, ao mesmo tempo, mais investimentos empresariais na inovação; aproximar a universidade e os centros de pesquisa e as empresas de base tecnológica; conjugar o desenvolvimento científico-tecnológico com o desenvolvimento social; combinar variáveis distintas, mas indispensáveis; esforço nacional, desconcentração regional, integração nacional e cooperação internacional. Esse conjunto de esforços tem como principal objetivo elevar a competitividade do país.

Nesse contexto, é oportuno ressaltar que, durante as três últimas décadas, o setor industrial no Brasil vem enfrentando profundas e radicais transformações em seu entorno. A explicação mais plausível para justificar a sobrevivência e o êxito corporativo está baseada nos processos de inovação e desenvolvimento tecnológico. Isso reforça a percepção de que a atividade inovadora deve ser considerada como uma autêntica necessidade, e não como uma possível alternativa estratégica. Assim, o fator tecnológico se converte em um aspecto vital para as empresas, e sua correta gestão constitui um elemento indispensável para a melhora da produtividade e da competitividade das mesmas. É oportuno observar que as garantias sobre as inovações de produtos, em muitos casos, são essenciais para a própria sobrevivência das empresas no mercado.

É sabido que existe uma estreita conexão entre patenteamento e competitividade, ou seja, o patenteamento de produtos está intimamente ligado ao grau de competitividade de um país. Torna-se recomendável, portanto, que o governo e a sociedade organizada desenvolvam esforços para melhorar a posição do país no ranking de competitividade mundial. Isso se revela necessário quando analisamos o número de pedidos de patente de empresas brasileiras em comparação a outros países com nível de desenvolvimento semelhante ao nosso. No "Anuário Mundial de Competitividade" de 2002, divulgado pelo IMD (International Institute for Management Development), o Brasil ficou em 35o lugar. Em 2001 ocupava o 31o lugar. Fica evidenciado, portanto, que a baixa penetração dos produtos brasileiros no mercado internacional está associada à queda de competitividade e de patenteamento.

Conclui-se, finalmente, que é necessário iniciar o processo de mudanças nessa área, por meio da reorganização do sistema responsável pela coordenação das políticas de proteção da propriedade intelectual no país, que não é mais capaz de responder adequadamente às demandas dos seus usuários. Essa realidade exige que as lideranças políticas e empresariais e pesquisadores intensifiquem os debates com a sociedade sobre o tema, com vista a incluir na agenda política a proposta de criação de uma "agência de proteção à propriedade intelectual" no Brasil.

Nota do Managing Editor: O presente texto foi primeiramente publicado na Folha de São Paulo, de 06 de maio de 2003. O autor é economista e advogado, doutor em ciência política pela Faculdade de Ciências Políticas da Universidade Complutense de Madri e, atualmente, professor-pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Administração da UnB.

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